quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

EXÉRCITO


Visão Geral
Em tempos de paz, o quartel-general dos selêucidas estava localizado em Apamea no Orontes. Seus exércitos estavam entre os maiores exércitos da era helenística e a coesão do império dependia principalmente da influência militar. Eram recrutadas tropas de todas as partes do império embora os guerreiros de descendência greco-macedônica tivessem maior proeminência para desencorajar ações separatistas entre as outras nacionalidades. Quando possível, os próprios reis selêucidas assumiam o comando do exército. Nesse aspecto, eles diferiam dos Ptolemeus do Egito, que deixavam o planejamento para militares mais experientes, como os líderes mercenários da Grécia. Os Selêucidas perpetuavam a tradição dos reis macedônios, os quais lideram pessoalmente suas forças militares. Isto indicava que seu poder dependia da boa vontade do exército e de seu sucesso no campo de batalha. Quando o rei estava impedido ou um exército secundário era formado, o comando caía sobre os vice-reis e ou sobre algum outro membro da dinastia. No entanto, essa tradição pode ter funcionado bem na Grécia e Macedônia de Filipe II bem como nas campanhas de Alexandre Magno (que além de ter um gênio militar incomparável, mal teve tempo de administrar as terras que conquistou), mas não era nada prático no Império Selêucida onde o monarca tinha que se desdobrar em rei e general de um vasto território. Os Selêucidas foram apenas parcialmente capazes de desenhar duas frentes de exércitos poderosos, de modo que as operações militares decisivas foram quase sempre realizadas pelo rei.
Ruínas de Apameia do Orontes, que era a sede militar dos Selêucidas em tempos de paz
(as construções são do período romano)
A estrutura do exército principal tinha um núcleo de elite das tropas regulares, que foi então ampliada com tropas regionais. Estas tropas eram geralmente subordinadas diretamente ao rei, enquanto muitas vezes os exércitos secundários eram liderados por mercenários. A estratégia militar selêucida assim diferia significativamente da dos romanos, uma vez que as legiões eram capazes de operar de forma independente, descentralizada, de modo que em vários locais exércitos romanos poderosos puderam ser estabelecidos. O rei selêucida, como o principal guerreiro de suas forças, tomava parte ativa nas batalhas. Enquanto isso causava um efeito positivo sobre os seus próprios soldados, por outro o rei perdia a visão geral dos eventos no campo de batalha. Isto aumentou a importância dos comandantes dos mercenários e das tropas não gregas. Os oficiais de alta patente eram geralmente membros da família real ou das famílias nobres da corte selêucida na Síria. Eles foram complementados pelos líderes mercenários. A ascensão na hierarquia militar do exército selêucida não era unicamente dependente da origem social, contando também com o mérito pessoal, de modo que era possível aos soldados subir a posições mais elevadas. As elites não gregas, no entanto, não ascendiam muito na carreira militar. À semelhança de outros exércitos helenísticos, o exército selêucida tinha na falange sua principal arma. A falange era uma densa formação de homens armados com escudos pequenos e longas lanças chamadas sarissa. Esta forma de luta foi desenvolvida pelo exército macedônio no reinado de Filipe II da Macedônia e seu filho Alexandre, o Grande. 
A Falange Selêucida

Os Recursos Humanos 
A distância entre a Grécia e a Macedônia exerceu forte influência sobre o sistema militar selêucida, uma vez que baseado principalmente na contratação de gregos e macedônios como o segmento-chave do exército. A fim de aumentar a população greco-macedônia no seu reino, os Selêucidas estabeleceram assentamentos militares. Houve dois períodos principais no desenvolvimento desses assentamentos, primeiro sob Seleuco I e Antíoco I e, em seguida, sob Antíoco IV. Os colonos militares receberam terras que variavam de tamanho segundo a posição e tempo de serviço. Essas colônias tinham um caráter urbano, que em algum momento poderia adquirir o status de uma polis, isto é, um centro urbano que seria mais do que um grande quartel, tendo um estatuto, magistrados e outros funcionários civis, etc. Enquanto os colonos militares dos Ptolomeus foram conhecidos como klerouchoi, os colonos selêucidas foram chamados katoikoi. Os colonos poderiam manter a terra como sua em troca de terem que servir no exército quando convocados. A maioria dos assentamentos está concentrada na Lídia, no norte da Síria, no Eufrates superior e na Média. Os gregos e os macedônios eram dominantes na Lídia, Frígia e Siria. Antíoco III trouxe gregos de Eubeia, Creta e Etólia e os instalou em Antioquia. Esses colonos seriam usados para formar a falange e as unidades de cavalaria selêucidas, com homens escolhidos posicionados nos regimentos de guarda do reino. O resto do exército consistia de um grande número de tropas nativas e mercenários. Estas tropas serviriam como tropas ligeiras auxiliares.
Parte da falange selêucida formada por katoikoi, colonos que serviam ao exército em troca de terras

Os Argiráspidas 
A principal unidade de guarda de infantaria do exército selêucida eram os Escudos de Prata, mais comumente conhecidos como argiráspidas. Eles foram uma unidade de guarda permanente formada a partir dos filhos dos colonos militares. Estavam armados ao estilo macedônico com uma sarissa e lutavam em formação de falange, assim como outros exércitos do período helenístico. Os argiráspidas provavelmente eram um corpo de cerca de 10.000 homens que foram selecionados principalmente da Síria e da Mesopotâmia, que eram os núcleos do reino selêucida, e onde havia uma maior densidade de soldados greco-macedônios.
A falange argiráspida

Infantaria Romanizada
 No ano de 166 a.C., quando o rei Antíoco IV desfilou em Dafne o corpo argiráspidas tinha apenas 5.000 homens. Esses soldados estavam armados em estilo romano e são descritos pelo historiador romano Políbio de tal maneira que se caracterizam com um corpo de elite do exército selêucida. A formação deste segmento na guarda real que usava métodos romanos ocorreu por vários fatores. Antíoco IV vivera parte de sua juventude em Roma e tinha adquirido uma admiração excessiva pelo poder de Roma e seus métodos de combate. A formação de combate romana deixava o exército mais eficiente para várias circunstâncias de batalha devido a sua mobilidade. Os Antigônidas (dinastia que governava a Macedônia e Grécia) sofreram sua terceira derrota para os romanos na Batalha de Pidna em 168, o que foi um enorme choque cultural, mostrando que sistema militar macedônio (falange) estava ultrapassado frente ao sistema militar romano (a legião). O fato de que esses 5.000 homens marcham à frente do exército é importante, talvez com o propósito de demonstrar a intenção de reformar todo o exército selêucida ao estilo romano. Soldados romanizados lutaram contra os judeus revoltosos na Batalha de Beth Zacarias em 162. Mas, não se sabe se houve um implementação completa da romanização do exército selêucida.
Tipos de soldados selêucidas, entre eles o da infantaria romanizada (a)


Crisáspidas e Calcáspidas
A maior parte da falange selêucida foi provavelmente composta de dois corpos que são mencionados no desfile de Dafne de 166 a.C: 10.000 crisáspidas (escudos dourados) e 5.000 calcáspidas (escudos de bronze). Pouco se sabe especificamente sobre eles. Na imagem acima a uma ilustração de um calcáspida (c).

Milícias Citadinas
Havia milícias citadinas, pelo menos na Síria. Essas eram compostas a partir das cidades gregas que não tinham nenhum papel específico no exército regular. Não se encontra elementos da milícia que participou das grandes campanhas antes do declínio geral do reino, que ocorreu na segunda metade do segundo século antes da era cristã. Desde então, muitos assentamentos militares importantes foram absorvidos pelos reinos de Pérgamo e da Pártia. Quando da batalha de Azoto (148 a.C.) contra os Macabeus, o exército selêucida foi chamado de o "poder das cidades ", provavelmente devido à alta proporção de milicianos mobilizados na região costeira da Palestina. Os cidadãos de Antioquia desempenharam um papel importante na derrubada do rei Demétrio II. Demétrio, depois de tomar o trono, decidiu dissolver a maior parte do exército regular e reduzir o pagamento de uma grande quantia. Em vez do exército regular, o poder de Demetrio foi baseado nos gregos, especialmente os mercenários cretenses, no que é conhecido como a "tirania de Creta ". Pouco tempo depois de Azoto, a maioria dos milicianos citadinos foi exterminada na desastrosa guerra de Antíoco VII contra os partos em 129 a.C.
Representação de um general selêucida

Aliados, vassalos e mercenários
Devido à falta de soldados greco-macedônios no reino selêucida o uso de aliados, de tropas vassalas e de mercenários foi grande. Frequentemente esses contingentes eram utilizados em tropas ligeiras e auxiliares que complementavam a falange e a cavalaria. Um grande número de soldados não-gregos lutaram na batalha de Ráfia em 217 a.C. Entre eles estavam 10 mil árabes, 5000 dahes, carmânios e cilícios. Alguns desses contingentes étnicos, quer sejam vassalos ou mercenários, foram muito úteis em determinadas situações. Os mercenários trácios, juntamente com os mísios e cilícios lutavam muito eficientes nos terrenos acidentados e áreas montanhosas. As tropas vassalas das áreas montanhosas do império foram usadas por Antíoco III na tomada de Elburz em 210. As tropas persas e iranianas tinham uma posição militar mais usual do que a maioria dos outros contingentes, uma vez que exercem funções de guarnição em todo o império. No desfile de Dafne de 166 a. C. o grande número de contingentes aliados e vassalos estão ausentes. Eles inspiravam pouca confiança e tinham eficiência duvidosa. Tanto é assim que Apiano os culpa pela derrota selêucida na batalha de Magnésia em 190 a.C. A ausência de auxiliares do exército de Antíoco IV pode ter contribuído para a sua força. A perda de contingentes não-gregos do exército foi compensada por mercenários, que eram mais experientes e bem treinados. Os mercenários trácios e gálatas em Dafne teriam sido de bom uso em campanhas em terrenos acidentados e montanhosos.
Exemplo de tropas auxiliares não-gregas

A Cavalaria
Ao contrário das potências ocidentais, como os romanos e outros estados gregos, onde a infantaria dominava o campo de batalha, nas grandes estepes orientais, a cavalaria era o elemento bélico mais influente. A velocidade e a mobilidade eram fundamentais, como demonstram a utilização da cavalaria pelos partos e pelos grecobactrianos. O uso oriental do cavalo na guerra teria um impacto profundo sobre o reinado de Antíoco III quando ele formou a sua cavalaria. No entanto, os principais rivais dos Selêucidas, os romanos e os Ptolomeus, usavam exércitos combinados embasados em torno de uma boa infantaria. Neste caso, há um movimento de supervalorização da cavalaria como uma arma ofensiva. Antíoco III era um líder excelente de cavalaria; a descrição que Políbio faz do ataque de Antíoco III a Tapuria é quase que um tratado sobre como conduzir uma cavalaria em batalhas. No entanto, Antíoco III subestimou o potencial da infantaria o que o levou a posterior derrota diante dos romanos. As unidades de cavalaria não era uniformes, tendo varações de tamanho, função e equipamento.

a) Agema e Hetairoi 
Junto com a unidade de infantaria da Guarda, havia dois regimentos de cavalaria da Guarda, cada um com 1.000 efetivos. Estes foram os agema (guarda) e hetairoi (companheiros). Os hetairoi eram recrutados entre os mais jovens dos colonos militares e atuavam como uma unidade de cavalaria de guarda do exército, servindo tanto em tempos de paz como de guerra. A agema era formada principalmente por homens selecionados dentre os medos, povo iraniano, com o complemento de cavaleiros oriundos de outros povos orientais. Ambos os corpos de cavalaria poderiam acompanhar o rei na batalha, ou ambos poderiam formar uma unidade de 2.000 homens. Ambas as unidades estavam armadas com um xyston, um tipo de lança que não difere muito da sarissa. Eles também eram equipados com um escudo e um capacete. Após a introdução dos catafractos (cavaleiros com armadura), os hetairoi receberam equipamentos de proteção similar, mas de menor proteção. Quanto aos integrantes da agema, esses seriam equipados de forma semelhante ao catafractos.

b) Epilektoi 
No desfile de Dafne também havia um regimento a cavalo de "seletos", conhecido como epilektoi, consistente em torno de 1.000 homens. Os epilektoi provavelmente eram recrutados na cidade de Larissa na Ásia Menor, fundada por colonos de Larissa, cidade da Grécia continental. Após a perda da Média para os partos, que era o principal campo de recrutamento para os agema, o rei Alexandre Balas concedeu aos epilektoi o título e papel dos agema.


b) Catafractos 
Apesar da cavalaria ser vista como uma falange, a cavalaria selêucida ainda enfrentava problemas. O xyston ainda era muito curto para igualar-se com a sarissa. O peso da armadura restringia os movimentos e a remoção do escudo protetor deixavam mais vulneráveis o cavalo e o cavaleiro. O desejo de igualar a cavalaria à falange e a necessidade de proteção foram corrigidos por Antíoco III entre 210 e 206 a. C. Nesse momento Antíoco entrou em contato com a cavalaria dos partos, que estavam fortemente armados com armas adequadas para o cavaleiro e o cavalo e lanças idôneas chamadas kontos. O kontos era praticamente igual a lança sarissa da falange. Surgia assim o cavaleiro catafracto (do grego kataphraktós, 'completamento coberto') cavaleiro com armadura que tinha numerosas vantagens. Primeiro, com a armadura tinha proteção contra flechas, lanças e piques. Em segundo lugar, com o kontos podia bloquear o avanço do inimigo e atacá-lo de longe . Os catafractos selêucidas foram capazes de vencer a cavalaria ptolomaica (egípcia) e atacar sua falange com relativa facilidade em Pânio em 200 a.C. No entanto, eles ainda tinham os seus problemas. Como a falange de infantaria, um ataque contra seu flanco poderia ser fatal e essas dificuldades foram usadas pela infantaria adversária, atacando as partes do corpo dos cavaleiros e cavalos que não estavam protegidas pela armadura. Para remediar esta situação, os Selêucidas foram obrigados a colocar cavaleiros com menor aparelhagem de armaduras para proteger seus flancos.
Ilustração de cavaleiros catafractos selêucidas

c) Politikoi 
Junto com a infantaria das milícias das cidades houve também regimentos de cavalaria, conhecidos como politikoi. A cavalaria da milícia citadina era recrutada por parte dos cidadãos mais ricos das cidades que não tinham o status legal de macedônios. A cavalaria citadina fez parte do célebre desfile de Dafne, neste caso , provavelmente, composta de elementos oriundos de Antioquia e de todas as cidades costeiras. Os politikoi provavelmente não eram um regimento de unidade de cavalaria, mas uma junção de esquadrões separados, contando cada um com sua própria indumentária e equipamentos.

Carros
Os carros foram pouco utilizados no exército selêucida sendo considerado de pouca vantagem nos combates e mais prejudicial do que benéfico nos manuais táticos gregos. No entanto, poderia ter um efeito terrível sobre os soldados mal treinados como os exércitos asiáticos tribais. Esse conceito (limitado) pode ter influenciado o rei Antíoco III a usar carros em sua guerra contra os romanos, o que, todavia, causou prejuízos ao seu próprio exército. 
Carros bélicos citas no exército selêucida
Elefantes
Os elefantes de guerra eram considerados confiáveis pelos escritores gregos, mas desempenharam um papel importante em muitas das batalhas do Império Selêucida, especialmente no Oriente. Eles foram particularmente vantajosos na batalha de Ipso (301 a.C.) em que Seleuco Nicátor posicionou seus elefantes em uma longa linha entre o campo de batalha e a cavalaria de Demétrio e conseguiu a vitória ante o receio dos cavalos de se aproximarem dos elefantes. Os elefantes de guerra eram geralmente equipados com uma torre em suas costas, levando vários soldados armados com longas lanças e projéteis (flechas ou dardos). O condutor, chamado de mahout, sentava-se no pescoço e guiava os elefantes na batalha. Os elefantes, por vezes, eram equipados com uma armadura para protegê-los e melhorar a sua defesa natural mantida pela espessura de suas peles.
Os elefantes bélicos selêucidas

Dromedários
Dromedários são atestados no exército selêucida na batalha de Magnésia (190 a.C.). Nessa batalha, que confrontou selêucidas e romanos, os dromedários eram montados de flecheiros árabes que também portavam espadas finas e compridas. Mas seu pequeno número (300 dromedários) sugere que não eram um elemento regular nas batalhas. 

Decadência 
Apesar das muitas vantagens que os Selêucidas vieram a ter no auge de seu poder, o império logo começou a cair em declínio, principalmente por causa do grande número de guerras dinásticas entre os pretendentes ao trono. Os romanos, querendo expandir seu poder no Oriente, souberam aproveitar essa fraqueza, principalmente depois da morte de Antíoco IV. Nas disputas dinásticas eles apoiavam os pretendentes menos capazes em detrimento dos mais fortes como no caso de em que apoiaram Antíoco V e Alexandre Balas em detrimento de Demétrio I. Roma apoiava, inclusive, as revoltas internas do império, como a dos Macabeus na Judeia. O enfraquecimento gradual do império levou os partos, povo iraniano, a se libertarem e a tomar as satrápias orientais. Essas conquistas ocorreram enquanto as guerras civis dilaceravam o império. A campanha de Antíoco VII contra os partas foi a última demonstração de força selêucida , mas a sua morte no campo de batalha levou a mais perdas e mais decadência. 
Componentes do exército selêucida: Nem os melhores homens e
equipamentos podem garantir a vitória de um império dividido
A perda dos territórios orientais significou a perda de vitais recursos econômicos e humanos. No início do primeiro século a.C., o reino selêucida ainda sofria com a instabilidade provocada pela guerra civil entre os ramos do norte e sul da casa real selêucida. A perda de súditos e a instabilidade política fazem supor que o exército selêucida nesse momento dependia de mercenários e milícias de cidadãos e foi incapaz de manter um contingente como nos dias áureos em Ráfia e Magnésia. Assim, enfraquecido por querelas internas, um dos mais poderosos exércitos da Antiguidade se desmantelou. Não há guerreiros, equipamentos bélicos, armaduras, carros, elefantes que resistam à falta de uma liderança capaz e coesa. No fim, o maior adversário do exército selêucida foram seus próprios reis.

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2 comentários:

  1. Excelente artigo. Uma pena que poucos brasileiros se entusiasmam com essa época e reinos que seriam considerados muitos específicos para serem escritos livros e traduzidos em português.

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